Não há dúvidas de que a COVID-19 causou uma das piores crises da nossa história, como também é possível afirmar que tem intensa relação com a crise ambiental e já havia sido sinalizada, ainda que sem “nome”, em 2016, pelo Relatório Frontiers 2016 Report: Emerging Issues of Environmental Concern do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
Conforme o referido documento, “A cada ano surgem em média três novas doenças infecciosas em seres humanos e 75% delas são zoonóticas”, a exemplo do coronavírus (UNEP, 2020, online).
Mas, afinal, qual é a causa do aumento dessas doenças e, por consequência, a causa da COVID-19?
Em primeira instância, pode-se apontar o próprio capitalismo, enquanto um modelo produtivo que explora a natureza, em todas as suas possibilidades, e acentua, em sua atual fase, a ruptura metabólica (FOSTER, 2005).
Nesse sentido, A UN Environment Programme (UNEP), a partir da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), afirma que os seres humanos podem ser considerados a única espécie responsável pela pandemia do COVID-19. Para corroborar, a organização destaca o aumento da população mundial e o crescimento da economia global nos últimos 50 anos (UNEP, 2020, online).
Para além da explosão demográfica, a National Geographic lançou, em outubro do ano passado, o documentário “Coronavírus: Alerta Ambiental”, no qual um grupo de cientistas e ativistas ambientais mostram a insustentabilidade da forma como nos relacionamos com a natureza, que é mais uma das vítimas da ação humana sobre o meio. Nesse sentido, o documentário reitera a conexão entre a caça e o comércio ilegal de animais com a origem da atual crise sanitária (REDAÇÃO GALILEU, 2020, online).
Feitas estas considerações, cabe, ainda, reafirmar a culpabilidade do avanço do capital e, em especial, da agricultura industrial frente à emergência de situações de caos, como o que se está vivendo. Rob Wallace, autor de “Big Farms Make Big Flu”, afirmou, em entrevista à revista socialista Marx:
[...] El capital está avanzando sobre los últimos bosques vírgenes y las granjas de los pequenos propietarios em todo el mundo. Estos avances traen consigo la deforestación y el desarrollo que llevan a emergências por enfermidades. La diversidade y complejidad que estas enormes masas de tierras representan están siendo reducidas de forma que los patógenos allí encerrados se esparcen sobre el ganado y las comunidades locales [...] (WALLACE, 2020, online).
Logo, é urgente repensar o atual modo de produção e construir alternativas que superem a geração de capital, sob pena de riscos à saúde humana e da natureza.
Nesse sentido, a Associação Natureza Portugal (ANP) e a WWF, em “Balanço de 2020 e Tendências para 2021”, alertam para a necessidade de operacionalizar o conceito de OneHealth (Uma Saúde para as Pessoas e para a Natureza). Conforme as entidades, “Se continuarmos a destruir a natureza a este ritmo, perdemos não só a base biofísica das nossas sociedades e da economia, mas também a nossa saúde” (ANP; WWF, 2020, online).
A pandemia não é um evento natural, mas sim, um reflexo das nossas escolhas e ações frente ao meio ambiente.
SUGESTÃO DE OBRA PARA LEITURA:
A obra é a edição brasileira de Big Farms Make Big Flu: Dispatches on Influenza, Agrobusiness, and the Nature of Science do filogéografo e biólogo evolucionista estadunidense Rob Wallace.
Em sua pesquisa, o autor demonstra como os vírus pandêmicos dos últimos tempos não são originário da natureza, mas sim de resíduos reais e letais produzidos nas operações agroindustriais de monocultivo genético.
Além da versão integral, a edição brasileira conta com dois artigos inéditos escritos por Rob Wallace em 2020, que refletem sobre as origens do vírus Sars-CoV-2, relacionando-o aos liames do capital.
Confira a animação de Steve Cutts produzida pelo departamento científico da Fundação Nicolaas G. Pierson do Partido Animalista Holandês (https://www.partyfortheanimals.com/pt).
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