José Vitor Ardinghi Brollo
Maria Eduarda Ardinghi Brollo
O conceito de tributação verde está estritamente ligado ao seu objetivo: a aplicação de tributos destinados a taxar os comportamentos nocivos ou incentivar os positivos para a saúde do planeta. Baseia-se, por um lado, no princípio do poluidor para taxar quem degrada o ecossistema, e por outro, na redução dos custos de direito (regulatórios/fiscais) de agentes econômicos que apresentam um comportamento de proteção das externalidades positivas ofertadas pelo que muitos denominam “serviços ecossistêmicos”[i].
O campo do direito ambiental tributário tem revelado ser uma alternativa inovadora no âmbito da ação estatal. Isso se deve, principalmente, à sua configuração operacional que incorpora a preservação do meio ambiente como um elemento determinante para a aplicação dos tributos. Utilizando o conceito de extrafiscalidade[ii], o Estado tem a capacidade de desempenhar um papel intervencionista nas ações humanas, notadamente nas situações em que tais ações impactam (negativa ou positivamente) o equilíbrio ambiental.
Na mesma medida, no entanto, que o campo das posturas fiscais verdes reforçam uma lógica já muito conhecida pelo direito ambiental contemporâneo, ele também tem um impacto na construção dos orçamentos estatais verdes. Essa natureza múltipla, de um lado moralizadora de práticas, e por outro construtora de política pública faz desse mecanismo um ponto controverso nas temáticas da proteção ambiental atual.
Um ponto que salta aos olhos é a utilização da retórica fortemente antropocêntrica[iii] das regulações financeiras praticadas, visto que abordam a natureza como provedora de serviços à humanidade, dificultando seu reconhecimento como sujeito de direitos ou mesmo promovendo o afastamento da raça humana como parte da sociobiodiversidade[iv].
Por outro lado, ainda que contenha esse elemento antropocêntrico e, com isso se insira em um cenário econômico capitalista financeirizado, a tributação verde apresenta um relevante potencial quando unida ao cenário das economias globais e da relevante necessidade de capital estatal para financiamento climático e indenização por perdas e danos por mudanças climáticas e políticas de preservação da Natureza.
Assim, a retórica do “recurso” natural representa uma faca de dois gumes: ao mesmo tempo que oferece base teórica viável para realizar a tributação de comportamentos dentro de um cenário antropocêntrico de capital financeirizado, dirime a habilidade construtiva dessa ferramenta orçamentária e regulatória quando da ampla proteção da Natureza como sujeito de direitos[v].
Nesse sentido, tributos verdes precisam passar por uma relevante lente para equalizar com teorias mais afinadas com a luta global contra as mudanças do clima e promoção de sustentabilidade e proteção da Natureza: a não utilização da afetação do recurso como medida de aplicação do tributo. A extrafiscalidade como ferramenta potencializada pelo respeito moral e legal à sociobiodiversidade e ao sistema natural como intitulado de direitos.
Notas e referências:
[i] Melo, M. E. (2016). Pagamentos por serviços ambientais (PSA): entre a proteção e a mercantilização dos serviços ecossistêmicos no contexto da crise ambiental (dissertação). Florianópolis - SC. 493 p. [ii] TORRES, H. T. Desenvolvimento, meio ambiente e extrafiscalidade no Brasil. Revista Videre, [S. l.], v. 3, n. 6, p. 11–52, 2013. Disponível em: https://ojs.ufgd.edu.br/index.php/videre/article/view/2255. Acesso em: 26 set. 2023. [iii] ARTAXO, P. Uma nova era geológica em nosso planeta: o Antropoceno?. Revista USP, [S. l.], n. 103, p. 13-24, 2014. DOI: 10.11606/issn.2316-9036.v0i103p13-24. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/99279. Acesso em: 26 set. 2023. [iv] NUNES CAVALHEIRO, Larissa; BONESSO DE ARAUJO, Luiz Ernani. DIREITO AMBIENTAL E AS DIVERSIDADES NATURAL E CULTURAL NO BRASIL: DIREITOS DA SOCIOBIODIVERSIDADE E SUSTENTABILIDADE NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA - DOI: http://dx.doi.org/ 10.5216/rfd.v%vi%i.32708. Revista da Faculdade de Direito da UFG, v. 41, n. 1, p. 123, 2017. Disponível em: <https://www.revistas.ufg.br/revfd/article/view/32708>. Acesso em: 26 set. 2023. [v] GUDYNAS, Eduardo. La senda biocéntrica: valores intrínsecos, derechos de la naturaleza y justicia ecológica. Tabula Rasa, Bogotá, n. 13, p. 45-71, July 2010. Available from <http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1794-24892010000200003&lng=en&nrm=iso>. access on 26 Sept. 2023.
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